sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Pelo direito de esconder minhas vergonhas!

Às vezes acho que estou até avançando rápido no meu gradual processo de germanização. Há uns dois meses meu veículo de transporte é uma bicicleta, meu armário já está cheio de roupas da cor marrom e hoje em dia salada, para mim, tem que ter pepino, senão fica faltando alguma coisa - em pensar que eu praticamente não comia pepino na casa de mamãe... Passei a ser fã de pão preto, do Kürbiskernbrötchen (pãozinho com sementes de abóbora, hummm... delicioso!) e das já conhecidas linguiças alemãs. E sim, eu bebo cerveja quente na maior!

Mas há dois fins de semana descobri que ainda faltam passos bem mais largos para incorporar a cultura germânica ao meu Brazilian way of life. Um exemplo disso seria começar a ficar peladona na frente de quem quer que seja - e agir como se nada estivesse acontecendo - em saunas.

Não dá! É contra os meus princípios! Da mesma maneira que encarar aquele vai e vem de corpos desnudos também me incomoda. Muito! Seja jovem, velho, criança. Não me sinto confortável e acho difícil mudar essa questão na minha cabeça aos 30 anos de idade. Sou geração pós-Adão e Eva, totalmente a favor de genitálias devidamente cobertas por calcinhas, calçolas ou mesmo folhas de bananeira.

Pois bem, tivemos a fantástica ideia de comprar no Peixe Urbano da Alemanha um 'vale dia-feliz' em um Sauna Park localizado em Königswinter, região próxima de Bonn. Um lugar bonito, bem verde, com várias casinhas de saunas espalhadas por um belo jardim. Eu e mais três amigas do trabalho chegamos no tal lugar por volta do meio-dia, chovia para caramba. Nas mochilinhas, claro, os biquininhos das moçoilas.

Na verdade, nós já sabíamos que as pessoas ficavam peladas nas saunas de vários países da Europa. Com relação às terras germânicas, pelo menos, eu tinha certeza desde o episódio com a minha então sogra alemã que me obrigou a ficar nua (!) com ela (!!!!!) na sauna da academia onde ela malhava. "Mas você vai colocar biquini? Não, por favor, vai chamar muita atenção!". Achei sem noção ela me pedir isso, mas em nome do bom relacionamento com a família do cara resolvi tirar os trajes e entregar para Deus. Também só estávamos nós duas no lugar, foi relativamente fácil. Mas na hora eu pensei: "e eu viajo 10 mil quilômetros para ver a minha sogra pelada... ninguém merece!"

Mesmo após esta experiência eu confiava que, escapando pelo "minha religião não permite", eu poderia ficar mais escondidinha de biquini em um cantinho da sauna sem que ninguém percebesse. Mas é claro que a combinação biquini + conversa em português + cor da pele (eu eu uma moçambicana já chamávamos suficiente atenção para o fato de que éramos estrangeiras) não poderia ajudar muito no nosso plano de passarmos imperceptíveis aos olhos dos peladões. Logo na segunda casinha, que ficava em uma área maior, uma funcionária do lugar nos abordou perguntando se era a primeira vez que íamos a uma sauna na Alemanha. Diante da nossa confirmação, ela continuou:

- É que aqui as pessoas ficam sem roupa. Sem biquini, nada. Vocês até podem andar de toalha pelo parque, mas dentro das saunas é preciso tirar tudo. Sabem como é, as pessoas reparam...
* (eu) Mas... em tese as pessoas não deveriam ficar se olhando dentro da sauna, certo? Se eu fico lá em cima, como é que as pessoas reparam?
- (tela azul)... é que já vieram reclamar. Vocês estão incomodando as pessoas assim... vestidas...

Simpática, coitada, ela ainda ficou toda feliz ao saber que éramos brasileiras. A irmã mora em uma cidade perto de Blumenau, disse. Antes de sair, ela ainda deu uma dica: "ela (eu) está de biquini sem alça, não chama tanta a atenção quando está de toalha entre uma sauna e outra. Tirem pelo menos a parte de cima".

Pois bem, muito a contragosto tiramos o sutiã. mas só fiquei sentada com o joelho encostado no peito a partir de então. Era hora do Aufguss, que eu chamo brincando de "defumação propriamente dita" - nada mais é do que uma funcionária do spa jogar o aromatizante nas pedras quentes e soprar o vapor para a nossa cara. A velharada, sorrindo, abre os braços e coloca as mãos atrás da cabeça para sentir melhor o bafo quente perfumado. "Nossa, que experiência mais diferente", murmurou uma amiga no meu ouvido, bem meiguinha. Eu segurando para não explodir de rir.

A etapa 2 consistia em esfregar sais do Mediterrâneo no corpo inteiro - fora da sauna, claro - tomar mais uma vaporzada e, por fim, uma ducha. Momento tenso porque era todo mundo pelado e se esfregando sal. Eu até gostei da ideia de tomar um bom banho de sal (infelizmente não era grosso) para espantar o mal olhado, como já recomenda o Candomblé. Mas eu e minhas companheiras ficamos absolutamente sem-graça com aquela cena. "Vamos fingir que estamos sozinhas aqui", alguém falou. Que tortura!

Depois do segundo Aufguss, fomos tomar banho. Sentimos umas caras feias para a gente, do tipo "o que estão fazendo aqui, suas vestidas?". Mas prosseguimos. Resolvemos desistir das saunas e nadar em alguma piscina dentro do prédio, já que a chuva não dava sinal de trégua. Novamente, pessoas nuas. Ficamos num cantinho, conversando. Olhares reprovadores.

Imagem do fôlder do Saunapark: lá, não tinha ninguém de toalha!

Por fim, deixamos a piscina a fim de ir para uma das banheiras de hidromassagem. Lá poderíamos ficar apenas nós quatro sem ninguém cobrando. Ledo engano. Com o jato da hidromassagem, estávamos praticamente gritando para conversar. Em português. Na minha tese, talvez isso tenha irritado até mais do que nossos corpitchos ligeiramente cobertos. A moça simpática reapareceu e disse bem claramente que uma senhora estava reclamando da gente. O motivo? "Elas estão vestidas, não seguem as regras!". Quase não acreditei. Resolvemos então, todas, tirar novamente o sutiã. Assim, ninguém poderia ver que estávamos de biquini.

De nada adiantou. Passados mais uns 10 minutos, veio a chefe do lugar. Ou tirávamos a roupa, ou teríamos que sair. Tentei argumentar. Disse que para mim era terrível tanto ficar nua quanto olhar aquele tanto de gente desfilando sem roupa de banho (tinha um senhor de idade que andava de um lado para outro do jardim, o tempo inteiro, com aquilo tudo lá de fora). Observamos uma mulher mais velha, com uma cara fechada, acompanhando a conversa e balançando positivamente a cabeça para a outra que praticamente nos expulsava. Sorriso no canto dos lábios. Em quê eu poderia estar incomodando aquela criatura por simplesmente defender o meu direito de mostrar o meu corpo unicamente para quem eu quero? "Desisto, meninas, espero vocês lá fora".

Chutaram nossa bunda para fora. Com uma certa classe, mas fomos enxotadas. Poucas vezes na Alemanha eu me senti tão ofendida, humilhada. Todos escutavam a dura da funcionária, como se tivéssemos cometido algum crime! Engraçado que enquanto as meninas tomavam banho para se trocar eu só pensava na chegada dos portugueses ao Brasil. Os livros de história contam que quando se depararam com todos aqueles índios de peitos e pintos de fora, os europeus, com uma volumosa combinação de peças de roupa, logo mandaram que "lhes escondessem as vergonhas". Ficaram indignados com a nudez dos habitantes locais, explicada em parte pelo clima quente e úmido do litoral do nordeste brasileiro. Olhando assim eu me senti mais alemã do que os próprios alemães. Por influência dos europeus eu não sou mais a índia da história. Se me ensinaram a ser assim, agora me deem o direito de esconder as minhas vergonhas!

Por fim, o que me deixa indignada é a hipocrisia. Consideram que a nudez de homens e mulheres em um local público representa os valores amadurecidos em uma sociedade supostamente moderna, livre e igualitária. Mas isso se revela uma grande fachada no momento em que ela passa a ser forçada, atropelando o direito do outro de ficar, simplesmente, vestido.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Chega de preguiça!

Depois de dois meses sem postar absolutamente nada, deixei o preguicê de lado e decidi voltar a escrever.

Na verdade, esse tempo foi meio confuso. Troquei de casa (mais uma vez, a quarta desde que cheguei, em fevereiro), de contrato no trabalho, de vida. Praticamente não uso mais transporte público - adotei uma bicicleta como companheira de trânsito. Mudei até de academia, agora pego mais pesado e continuo firme no Projeto Delícia 2014. Enfim, continuo na meta de tentar ser mais regrada e tentar passar tudo para o papel - ou melhor, para a página virtual - as experiências dessa terra cada dia mais surpreendente (pelo menos para mim) chamada Alemanha.

Auf Wiederlesen!

domingo, 17 de julho de 2011

Simpáticos, mas barulhentos

Mandar recado pela janela do prédio, chamar um conhecido do outro lado da rua ou cantar feliz e sóbrio dentro do ônibus definitivamente não é algo tipicamente alemão. A turma por aqui não gosta muito de levantar a voz.

A economia de ruído chega a ser tamanha que o marido de uma amiga contou dia desses que, durante uma partida de futebol feminino à qual assistia pela televisão, ele teve certeza que a trasmissão estava com problemas. Ouvia-se quase nada - ou muito pouco - entre uma jogada e outra. Ele aumentou o volume, mexeu no cabo da antena, apertou botões e nada. Ao mudar de canal, descobriu que não havia defeito de transmissão, não. Simplesmente este era o estilo alemão de transmistir a partida (Galvão Bueno não teria muito futuro por aqui)

Vinda de uma família de sangue baiano, sem muito jeito com o recatamento ou com o fino trato, fui criada no meio do barulho, da música, do furdunço e da confusão. O silêncio germânico às vezes me incomoda, mas estou na casa deles e o que me resta é tentar me adaptar. O que implica também em reduzir o volume dos meus decibéis.

A turma brazuca que vive em Bonn também vive a mesma situação. Frequentemente a gente escuta a frase  "die Brasilianer sind nett aber so laut!!" (os brasileiros são simpáticos, mas tão barulhentos!!) - o que de todo não é uma injustiça, mas ainda assim nos deixa um pouco indignados com o tom de exagero. Nossa mesa no almoço da DW, por exemplo, é a mais agitada e sorridente. Mas a gente não chega a ponto de incomodar a refeição de ninguém... eu acho...

Dia desses às 21h20 eu cheguei em casa, liguei o computador eu mal esperava para falar com a minha mãe pelo Skype. Minha conexão wlan do prédio só funciona bem perto da janela. Chamada feita, fui perguntando as novidades para ela enquanto trocava de roupa e pegava um suco na geladeira no meu microapartamento. Óquei, eu falava um pouquinho alto nessa hora. Mas a impaciência do meu vizinho não o deixou esperar mais de cinco minutos (juro!) para vir bater na minha porta: "será que dá para falar mais baixo, por favor? Ou então fechar toda a sua janela? estou tentando dormir e não consigo!".  "Claro, desculpe", eu disse, sem querer estender a conversa. Ao fechar a porta, pensei: "pô, quem é que vai para a cama às nove da noite?!?!?"

Esta semana a reclamação foi no meu aniversário. Em determinado momento, alguém resolveu puxar o parabéns - imagina, aniversário sem parabéns não tem graça! Versão em português, versão em alemão... quando estava apagando a última velinha veio o garçom (que também tinha a maior pinta de estrangeiro) e pediu, meio sem-graça, que parássemos de fazer barulho. Inacreditável! Num bar cujo nome é Havanna e leva a foto do Che estampada no cardápio, música ao fundo, cheio de gente jovem, não se pode cantar "parabéns"! Surreal! Ainda acho que se tivéssemos cantado apenas a versão na língua local, talvez não tivessem implicado com a nossa alegria. Enfim, decidi não colocar meus pezinhos lá novamente tão cedo.

Turma do barulho no Havanna

Só digo uma coisa: aaaaahhhh, se eu tivesse uma laje!!!!

sábado, 9 de julho de 2011

Acolhida na casa de desconhecidos

Esta semana eu descobri o verdadeiro sentido da palavra perrengue.

Na quinta-feira passada, combinei com um amigo alemão - que adora o Brasil e é uma figuraça! - de visitá-lo em Colônia, onde ele mora, após o meu expediente. O trem de Bonn para lá geralmente leva de 25 a 30 minutos, dependendo do tipo do trem e da estação em que se desce.

Ele mora justamente perto da estação mais distante, onde eu nunca tinha descido. Cheguei tarde, pra lá das nove da noite, e ficamos batendo papo até o sol se pôr completamente, perto de onze horas, em uma bonita área verde às margens do rio. Eu tinha visto no plano da estação que haveria um trem que sairia às 23h26 e passaria por Bonn. "É esse", pensei.

Ele me levou até a estação e também leu "Bonn" na placa indicando os trechos por onde o RE 9 passaria. Antes de embarcar, a locutora da estação ainda chamou em voz alta os passageiros que embarcariam no trem com destino a Siegen passando por "... Bonn". Fechou! Não tinha como errar.

Percebi logo de início que o trajeto era diferente dos trens que costumam fazer Colônia-Bonn. Imaginei que ele devia fazer as estações mais afastadas antes de chegar à estação central da minha cidade. Passou por várias estações de nome familiar, que eu sabia que ficavam nos arredores, mas nada de Bonn Hauptbahnhof chegar. E se passaram 20, 30, 40 minutos... ops! Tem algo errado aí! Os nomes das próximas paradas já me eram totalmente desconhecidos neste momento. E a moça que controla o bilhete já tinha passado há muito tempo. Hummm... desci para pedir informação e de me deparei com um mapa das trajetórias dos trens que cobrem a região.

Qual não foi a minha surpresa quando descobri, pra lá de meia-noite, que a linha que eu peguei fazia o trajeto exatamente oposto ao que eu deveria fazer a partir da estação Siegburg-Bonn (aí estava o "Bonn"que a gente ouviu e leu em Colônia). Eu deveria ter descido lá, tipo 20 minutos atrás, e de lá ter pego um metrô para a estação central de Bonn.

Não imaginei a dimensão do problema na hora. Só pensei que o mais óbvio era descer e esperar, na plataforma oposta, por um novo trem que me levasse na direção contrária. Ia chegar tarde em casa, mas paciência. Desci na estação de Au (é, o nome da parada já não era bom presságio), a primeira após eu ter descoberto o engano, e saí correndo para conseguir pegar o outro trem. Mas... que trem? Não tinha nada além de uma placa indicando "veja os horários no plano".

Era 0h20 e não se ouvia o barulho de mais nada, além do meu coração saltando pela boca de nervosismo. Vi um funcionário da empresa de transporte que passava apressado e perguntei a ele quando saia o próximo trem para Bonn. Ele olhou no relógio e me disse "às 4h20". Meus olhos se encheram de lágrimas. E nem adiantaria tentar outra estação próxima, ele disse. Não tinha mesmo mais como viajar naquele horário. "Lamento muito".

A estação era bem velha. Não tinha um único banco ou cadeira ao alcance dos meus olhos. Começava a esfriar. Eu me encontrava sozinha, no meio do nada. Liguei para o meu amigo, chorando, para ele me dizer onde eu estava. Assustado, ele tentava entender como é que a gente tinha se confundido. Pela internet, descobriu que eu estava em uma vila de 325 habitantes a 60 quilômetros de casa. Segundo o disque-taxi, primeira solução que veio à cabeça, a corrida não sairia por menos de 100 euros - quantia da qual obviamente eu não dispunha na hora e, confesso, nem estava disposta a pagar.

A solução seria procurar um outro lugar para passar as próximas quatro horas. Eu não conseguia acreditar que aquilo estava acontecendo. Quando finalmente consegui sair da área dos trens, vi uma plaquinha informando que haveria um hotel em algum lugar a 300 metros. A seta indicava para uma rua com algumas casas, mas completamente no escuro. Dei alguns passos, mas logo voltei. Na área em volta só tinha mato. Au era definitivamente uma roça.

Por sorte, ouvi o barulho de trem e voltei para a estação. Uma linha acabava de completar seu itinerário ali - só partiria na manhã do dia seguinte. Mas pelo menos havia algumas pessoas desembarcando. Teria a quem perguntar para onde ir. Ainda com a voz embargada, abordei um casal.

"Sei que parece inacreditável, mas peguei o trem errado e agora não posso voltar para Bonn. Também não tenho como ficar aqui nesta estação ao relento. Vocês sabem onde existe um hotel aqui?".

Eles ficaram morrendo de pena, pelo jeito com que me olharam. Lamentaram meu engano e disseram que me levariam lá de carro. O "hotel" (imagine um hotel num lugar onde moram 325 pessoas?!) estava fechado e com todas as luzes apagadas. No meio do caminho, enquanto eu informava meu amigo por telefone de que estava com um jovem casal que acabara de conhecer (e também para eles virem que eu não estava sozinha no mundo), um perguntou pro outro o que achava de me levarem para casa, pois dadas as circunstâncias e o horário, o melhor seria me darem abrigo.

Inga e Sebastian foram dois anjos: ela fez uma caminha para mim no escritório; ele perguntou se eu estava com fome e me ofereceu pão, queijo... Eu disse que já tinha comido. Ela ainda fez um mapinha de como eu deveria me orientar na estrada no meio do mato para sair da casa deles e voltar à estação dali a algumas horas.

Não consegui pregar os olhos até dar a hora de partir. Decidi pegar o trem das 5h20, para não ter que andar no escuro. Aí veio, claro, a última aventura da noite: começou a chover forte na hora de sair. Coloquei uma sacolinha plástica que tinha na bolsa na cabeça e cheguei com o resto todo molhado a tempo de pegar o trem que, finalmente, me traria de volta para casa.

Na mesa do escritório de Inga e Sebastian deixei um bilhete agradecendo o que fizeram por mim e com meu e-mail. Espero que entrem em contato. Quem sabe não é o início de uma bela amizade?

Sobre burcas e berimbaus

Um dos poucos assuntos sobre os quais eu realmente me calo é religião. Sou cristã (talvez até possa me definir católica, pois apesar das minhas centenas de críticas ao Vaticano), mas sempre respeitei a fé e a convicção alheias. Não me lembro de algum dia ter tentado convencer alguém à força de que as minhas crenças seriam mais corretas. E sempre detestei quem fizesse isso.

Mas há coisas que não passam despercebidas. E é impossível dizer que não me sinto incomodada, de certa maneira.

A forte presença muçulmana no lado ocidental da Europa não é mais novidade para ninguém. Claro, eles - ou melhor, elas - são bastante visíveis, por assim dizer. A todo momento, por menor que seja a cidade, a gente topa com mulheres usando véus cobrindo os cabelos ou mesmo burcas inteiras, deixando só os olhos de fora.

Mas na semana passada foi a primeira vez que eu vi uma jovenzinha turca jogando capoeira. Foi durante a apresentação de um coral formado por brasileiros e alemães, em Colônia. Um estranho choque cultural.

A capoeira é uma das coisas que mais identifica o Brasil fora do Brasil. Ver aquela menina sorridente, corpo esbelto, gingando de um lado para outro e trocando passos com outras meninas - e até homens - foi lindo de ver!

O que chamava mais a atenção, no entanto, era o fato de que a cada pirueta no ar, ela logo jogava as mãos na cabeça, num movimento meio desesperado tentando se certificar se o cabelo ainda estava completamente sob o véu. E na medida em que o jogo de corpos ia ficando mais intenso e mais rápido, mais ela se desconcentrava com o pano.

Achei isso tudo meio paradoxal. Em uma luta-dança cheia de movimentos corporais sensuais, abdomes travados e suados, a menina tentava esconder a todo custo até a  ponta do cabelo... Eu já tinha percebido que por baixo da camiseta do grupo de capoeira ela usava uma espécie de collant grossa cor da pele e um calçolão preto por cima, que impedia qualquer possibilidade de mostrar um pedacinho sequer do corpo da moça.

Ao mesmo tempo em que admirei aquela garota, por ela ter dado um jeito de fazer o que gosta dentro das limitações impostas pela religião, aquela cena me deixou um pouco indignada. É claro que vir de um país onde as mulheres desfilam praticamente peladas no carnaval, onde mostrar o corpo está longe de ser tabu, dificulta a minha compreensão sobre como algumas culturas consideram esse tema. Mas ainda assim, não consigo deixar de defender que as pessoas tenham o direito de ser livres em suas escolhas. Que elas possam decidir o que vão ouvir, vestir ou dançar, sem opressão ou ameaças religiosas.

Adoraria ter visto os cabelos da turquinha no ar, e suas mãos livres, o que deixaria seus impressionantes movimentos ainda mais bonitos.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Marta: "Está mais do que na hora de chegar à final e fazer diferente"

"Queremos ser campeãs mundiais para que realmente possamos ter um futuro melhor para o futebol feminino no Brasil", afirma a atacante da seleção brasileira em entrevista à Deutsche Welle.

 

No gramado do centro esportivo nos arredores da cidade de Düsseldorf, na Alemanha, a seleção brasileira de futebol feminino começa a ensaiar os passos rumo a uma possível conquista inédita: a vitória na Copa do Mundo. O treino comandado pelo técnico Kleiton Lima é intenso. O sol do verão germânico, implacável.

No cantinho do campo, deitada de bruços, uma das jogadoras recebe tratamento rotineiro de recuperação muscular na coxa direita, com um pequeno aparelho de contração. É Marta, a estrela do time. Sorridente, ela observa no visor do aparelho o tempo que ainda falta para seguir recebendo os pequenos choques. "Podemos conversar agora, pode ser?", diz a alagoana à reportagem da Deutsche Welle, segundos antes de um dos integrantes da equipe técnica da seleção despejar sobre a cabeça da atleta uma pequena garrafa com água. "É batismo!", brinca o colega, diante dos risos de todos.

O clima de descontração ganha ar mais sério quando a alagoana de 25 anos começa a falar de sua determinação em levar para casa o troféu de campeã do mundo. "Está mais do que na hora de a gente chegar a essas finais e fazer diferente", sentencia, confiante.

Apesar do estupendo desempenho individual de Marta – eleita por cinco anos consecutivos a melhor jogadora do mundo – o time brasileiro vem sentindo nos últimos anos apenas o gosto amargo do segundo lugar: o vice-campeonato da Copa do Mundo de 2007, na China, e duas medalhas de prata nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004, e de Pequim, em 2008. "No Brasil, o segundo lugar não é considerado. Claro que não é um título, mas para o futebol feminino, que já passou por vários momentos difíceis, chegar a duas finais de olimpíada e uma de mundial é grande coisa", diz a atacante.

Atualmente jogando no New York Flash, dos Estados Unidos, a "Rainha Marta" avalia que, apesar da força do futebol norte-americano, são as alemãs que oferecem mais perigo neste mundial. "Quando você tem a torcida a seu favor, dá uma motivação a mais", explica. Ela garante, no entanto, que o grupo não vai se intimidar se topar com as alemãs ao longo da competição. "Temos que estar preparadas para enfrentar qualquer equipe", diz.

Deutsche Welle: Vocês estão otimistas com esta Copa na Alemanha? É a vez do Brasil?

Marta: Estamos super animadas e o otimismo existe sempre quando se trata de uma competição de alto nível, como é uma Copa do Mundo. E pelo fato de a gente vir já há muitos anos se destacando mundialmente nos torneios mais importantes, vai crescendo cada vez mais a vontade de conquistar um título de alto nível. A equipe está bem representada, tem meninas novas e também outras com bastante experiência. Espero que essa mistura de experiência de juventude possa trazer bons resultados já na estreia, para que a gente possa começar bem.

Como controlar a ansiedade neste momento?

Estou super tranquila, tento passar isso para as meninas também, para que quando chegar o momento certo a gente possa definir as coisas e não ter nada que atrapalhe psicologicamente. Agora vamos ter mais uma chance. Está mais do que na hora de a gente chegar a essas finais e fazer diferente. Já passamos por finais, já sabemos como é jogar em uma. Então encaramos de uma maneira não mais fácil, mas mais tranquila.

Das três equipes adversárias desta primeira fase (Austrália, Noruega e Guiné Equatorial), qual deve ser a mais dura?

Todas serão bastante difíceis, são adversárias que nós não temos tanto conhecimento. A não ser a Noruega, sabemos o estilo de jogo delas – um estilo bem forte, uma pegada bastante intensiva, com muita marcação. A Austrália vem se preparando já há algum tempo, é a atual campeã da Ásia, tem meninas novas, com alto nível. E por ser estreia também vai ser bastante difícil.

Existe a pressão da estreia?

Sem dúvida, a pressão sempre existe quando se trata de Brasil. E isso acontece devido aos destaques que viemos conquistando ao longo do tempo, como o vice-campeonato mundial (2007), e as duas medalhas de prata nas Olimpíadas (2004 e 2008). A pressão vem não apenas por parte do público brasileiro, mas também do público mundial, que já tem uma visão diferente da equipe brasileira.

Qual seleção deste mundial deverá dar mais trabalho para o time brasileiro em futuros confrontos?

Sem dúvida será a Alemanha, por estar jogando em casa. Sem menosprezar as outras equipes, mas quando você tem a torcida a seu favor, é lógico que isso dá uma motivação a mais. E também pelo fato de a Alemanha ser bicampeã mundial e estar sempre se destacando em competições de alto nível. É uma escola que já há muitos anos está em primeiro e segundo lugar no ranking. Mas o Brasil neste momento está pensando na estreia, nas três equipes que vai entrar no seu grupo nesta primeira fase. Temos que pensar uma coisa de cada vez. Mas se vier a Alemanha, ou os EUA, ou qualquer outra equipe que seja, temos que estar preparadas para encará-las.

Vocês chegaram a ver a partida da Alemanha contra o Canadá?

Vimos muito pouco. Aproveitei quando fui para a coletiva de imprensa, vi alguma coisa, mas não dava para me concentrar nas perguntas e ver o jogo ao mesmo tempo. Mas vimos que o Canadá é uma equipe muito forte, tanto que a Alemanha ganhou de 2 a 1, num jogo bem apertado. Sabemos que este Mundial será assim: com equipes fortes, um nível muito alto.

Como você está preparando para a marcação individual cerrada que os treinadores das equipes adversárias do Brasil provavelmente estão planejando?

Eu já convivo com esta pressão há muito tempo. A partir do momento em que você se destaca, recebe maior atenção por parte da imprensa e das adversárias. Em vez de colocar uma na marcação, eles colocam duas, uma na sobra. Acho que não vai ser diferente neste Mundial. Mas, se isso acontecer, espero que abra espaço para as outras meninas e elas possam aproveitar bastante.

Uma vitória nesta Copa poderia ajudar a mudar o cenário do futebol feminino no Brasil?


Essa é uma esperança que a gente tem: poder conquistar um título de alto nível, como uma Copa do Mundo, ou brigar por uma medalha de ouro nas Olimpíadas, para que a gente possa ter algo em mãos para reivindicar. Em geral, no Brasil, o segundo lugar não é considerado. Claro que não é um título, mas para o futebol feminino, que já passou por vários momentos difíceis, chegar a duas finais olímpicas e uma de Mundial é grande coisa. Mas a gente não quer só isso. Queremos ser campeãs mundiais para que realmente possamos ter um futuro melhor para a modalidade dentro do país.

Autora: Mariana Santos
Revisão: Alexandre Schossler

Meu dia de tiete

Ela passou de fone no ouvido, umas meias diferentes esticadas até a coxa, cabelo preso. Parecia estar mais preocupada em achar a música certa no aparelhinho de som do que no que se passava em volta.

Antes que ela subisse no ônibus da seleção, eu a abordei e pedi uma entrevista curtinha depois do treino - para onde elas seguiriam nos próximos minutos. Marta, a estrela do time brasileiro, paparicada pela equipe técnica, pelos jornalistas e pelos fãs, topou sem exitar. Só me pediu para avisar a assessoria de imprensa.

Passei os minutos seguintes imaginando o que devia passar na cabeça daquela garota (sim, é uma garota de 25 anos) nascida no interior do Brasil, no sertão de Alagoas, e que agora brilha no mundo. Como deve ser a sensação de ter sido escolhida por cinco, cinco vezes!, a melhor jogadora de futebol do mundo?? Logo futebol!! Imaginei como havia sido o caminho até lá. "Bem difícil", ela me respondeu com o microfone já desligado, depois da entrevista formal sobre suas expectativas com a Copa de Futebol Feminino, que começou na semana passada aqui na Alemanha.

Que admiração! Que talento! Que garra! E ela é nossa!! Assim como o Pelé, como o Zico, como o Ronaldinho, a Marta é verde-e-amarelo. Com a diferença que, mais do que "apenas" jogar bola, ela precisou lutar contra todo o tipo de preconceito, de desestímulo e contra a estranha desvalorização do futebol feminino no país mundialmente famoso pelo... futebol!

Eu e a Melhor do Mundo conversamos após o treino. Ela me deu respostas firmes e seguras, coisa de quem manja bem sobre o que está falando - e de quem já deu respostas parecidas zilhões de vezes, como sempre acontece no futebol. O papo mulherzinha veio logo em seguida, quando eu já não gravava mais nada: ela contou que curte invernos gelados (adora usar botas e aqueles casacões elegantes) e que gostava de andar de trem quando morava Suécia. Falamos até sobre depilação e viagens.

Tive a impressão de que ela, ao mesmo tempo em que ainda parece ficar um pouco constrangida diante das colegas de uniforme por ser o centro das atenções, tem consicência de que fez por merecer. Aceita o super talento que tem sem ser pedante. Faz questão de mostrar que ainda é a menina de Dois Riachos.

Virei ainda mais fã!

Abaixo as meias pretas!

Engraçado como a gente consegue enxergar melhor nossas particularidades quando está fora de casa - o nosso Brazilian way of life. As diferentes formas de pensar, de se vestir, de se comportar (de escrever, no meu caso que lido diretamente com textos) entre pessoas de nacionalidades distintas são interessantes e, ao mesmo tempo, assustadoras.

Algumas coisas do cotidiano aqui na Alemanha ainda têm esse efeito sobre mim - ainda incluída na categoria de "recém-chegada". Um exemplo são as meias pretas. Como gostam de meias pretas! Especialmente com tênis. As pessoas vão malhar, jogar bola, correr no parque de meias pretas. Pouquíssimos coleguinhas de academia usam meias brancas, como as minhas.

Reparei nisso no dia em que desci do vestiário - que fica no terceiro andar - para a sala dos aparelhos, no primeiro. Eu, minha calça legging coladésima, minha blusa igualmente justa e, claro, as meias brancas (de cano médio puxadas para cima). Normalíssima em Brasília. Um ET em Bonn. Além da cara de "que roupa é essa, minha filha?!", os olhares de todos pousavam, em algum momento, sobre as minhas meias. Eu me senti quase como aqueles turistas norte-americanos que usam meia branca até o joelho, calça caqui, colete e câmera fotográfica no pescoço. Fiquei com vontade de rir de mim mesma, imaginando que aquele povo usando meia preta e fazendo uns exercícios de alongamento mega bizarros para os meus olhos tupiniquins (eles se alongam de maneira diferente também) estavam achando graça do meu jeito "normal" de me vestir.

Dormir aqui também se tornou um problema. Além do azar de já estar na segunda casa e sofrer com o segundo colchão horroroso, ainda não me adaptei ao travesseiro à moda germânica. Ele é um quadradão, 80 X 80 cm, que afunda e fica fino quando você coloca a cabeça. Horrível. Jana, minha amiga-irmã alemã, ficava indignada quando eu perguntava como é que ela conseguia dormir com aquilo. "Como você consegue dormir com esse tijolo!!", ela devolvia. Procurei outros tipos de travesseiros nas lojas. Eles têm vários outros, mas nenhum igual a esses que estamos acostumados. Meu jeitinho está sendo dobrar o bendito ao meio.

E assim a gente vai se adaptando...

sábado, 18 de junho de 2011

Um presente marcante

Essa fazia tempo que eu queria compartilhar...

Sabe quando uma criança quer muito, muito mesmo um presente? Pode ser um brinquedo, ou uma peça de roupa que ela viu trocentas vezes na propaganda da tevê, ou um bichinho de estimação. Ela sonha com ele há dias, semanas - que parecem meses quando a gente é criança - e de repente, não mais que de repente, o pai, a mãe, a tia (ou mesmo o papai noel!) entrega o embrulho com este presente dentro. Olhos brilhantes, mãos suando, a criança já imagina o que seja aquilo pela embalagem. Ela destroe rapidamente o papel e solta um grito feliz, como se nada no mundo importasse mais do que aquele objeto dos desejos logo ali, na sua frente...

Essa foi a imagem que tive ao ver a Jana, minha amiga e ex-roommate alemã, ao receber meu presente de aniversário: um par de havaianas.

Há tempos eu não via alguém tão contente com um presente. Ganhei o dia com a felicidade dela. Há uns dois anos ela esteve no Brasil, mas apressada pelo grupo de viagem, acabou deixando para trás o que mais queria ter trazido do outro lado do Atlântico. Vivia se lamentando para mim por isso sempre que me via com o meu chinelo velhinho.

Ela não tirou mais as havaianas do pé. Disse que já se sentia mais "brasileira", que a cor era linda (são brancas, daquelas com a bandeira do Brasil nas tiras - tipicamente para exportação) e começou a ensaiar uns passos desajeitados de samba. Rodopiava e ria, ria muito. Disse que ia desfilar o verão inteiro com elas. Me deu 20 abraços apertados durante os poucos segundos em que não estava passando as mãos nos chinelos - comprados pela minha mãe em Brasília e trazidos gentilmente pelo Marcelo, quando nos encontramos em Barcelona. Eram havaianas genuinamente brasileiras!

Acho que nunca vou me esquecer dessa cena... como às vezes pequenos gestos nossos podem ser surpreendentemente tão grandes para alguém. E nos encher de alegria.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Alemanha, terra do carnaval!

Parece até ironia. Mas em apenas três meses de Alemanha a palavra "Karneval" foi uma das que mais ouvi por aqui.

Primeiramente em março, na data oficial. Enquanto as estereotipadas mulatas do Rio mostravam seus imensos traseiros na Sapucaí, e os cantores de axé se esgoelavam em cima dos trios elétricos na Bahia, aqui na Alemanha a festa de rei Momo também teve vez. No "carnaval mais famoso da Alemanha" - como se isso me dissesse alguma coisa assim que cheguei - os foliões também desfilavam com suas curiosas fantasias pelas ruas de Colônia. É claro que, sob um clima que só com muita sorte ultrapassa a marca dos 10 graus, não dá para pensar em usar algo muito descoberto, como no Brasil. Mas aqui também tem desfile em carro aberto, música, (muuuuita) bebida e sujeira na rua.

Obviamente não pude escapar das perguntas: "e como é o carnaval no Brasil? Muito diferente daqui?". Sim, claro que é. A começar pelo frio. O desfile também tem outra vibe. As pessoas ficam gritando em baixo e a galera de cima dos carros joga doces, flores e até rodelas de linguiças embaladas no plástico (salve o clichê!).

Mas também tem as semelhanças. Vi vários folhetos nos ônibus e trens incentivando o uso de camisinha. Também se faz muito minino nessa época na Alemanha, quem disse que não?! Quem mora há mais tempo aqui nesta região do estado de Nordrhein-Westfalen, considerada a mais festeira do país, conta ainda que o povo fica mais alegre, mais saidinho. Nos bares, depois dos desfiles, a galera se pega forte. Esquema "beijo-não-me-liga". Uma micarê em pleno solo germânico.

A principal diferença, porém, é que apesar da bebedeira geral, aqui eu não vi confusão.
  
Sim, mas voltando a falar de carnaval. Neste fim de semana passado rolou o Carnaval das Culturas, em Berlim. Pessoas de diversas nacionalidades montam seus blocos para mostrar o que seu país têm de mais animado. Acho que o Brasil participa bem com uns 10 blocos, no mínimo. Um grupo de afoxé (!) abriu o desfile, com uma pseudo-Ivete puxando coro de cima do... digamos, trio. A alemãozada de fora do bloco não se mexia muito, mas fazia cara de quem tava gostando. E assim os grupos vão se sucedendo neste desfile, no bairro de Kreuzberg. Quando a gente ouvia uma barulheira se aproximando, batata!, era algum grupo brasileiro. Como somos barulhentos! Que alegria!

Eu e Jana, minha irmãzinha alemã, nos juntamos a um dos grupos de afrosamba, sambareggae, axéilê (ou qualquer coisa de nome parecido que tenha batuque e gente suada). E literalmente pulamos atrás do bloco. Dezenas de pessoas loiras com câmeras na mão fotografando os músicos e nós, os foliões.

O brazuca mais famoso, no entanto, é o bloco que leva o criativo nome de Sapucaiu no Samba. Além de bateria com surdo, cuíca e tamborim, o grupo tem mulata e fantasia de penas. Eu juuuuuro que vi um protótipo de Ala das Baianas rodando para lá e para cá.

Os termômetros em Berlim bateram na casa dos 25 graus, ou um pouco mais, seguramente.

Eu me senti em casa.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Comi salada, e agora?

O que era para ser pânico, virou piada. Pelo menos entre a comunidade brazuca daqui de Bonn.

Desde que surgiu essa história de contaminação pela EHEC, os coleguinhas de redação se revezam com a frase: "Ontem comi salada. Será que eu vou ter um treco?". Pelo menos até agora, todos passam bem.

Há pelo menos três semanas, uma bacteriazinha sem graça resolveu estragar o prazer de se comer uma boa salada neste abafado fim de primavera europeu. As primeiras notícias foram de que a nova "cepa", a EHEC, estaria instalada nos pepinos vindo da Espanha. Suspende o pepino espanhol, minha gente!!!

Depois de análises em laboratórios, verificaram que os pobres vegetales estavam sendo vítimas de uma grande injustiça. Não tinham nada a ver com a história. Quer dizer, até encontraram uns bichinhos de leve, mas nada que chegasse aos pés do poder da EHEC. Mesmo assim, apesar de serem loucos por pepinos, os alemães mantiveram o boicote.

Em seguida, a recomendação do governo passou a ser evitar alface e tomate cru. Uma amiga nos contou que ficou assustadíssima quando leu a notícia no fim de semana passado. Logo alface e tomate? Decidiu seguir à risca a ordem e, depois de sair do cinema no domingo à noite, sentou-se num restaurante e pediu um delicioso prato de brotos.

Manchetes do dia seguinte: "Brotos suspeitos de transmitir EHEC".

Mais uma vez, os laboratórios super eficientes da Alemanha descobriram rapidamente que uma nova injustiça havia sido feita. Os brotinhos eram mesmo inofensivos.

Hoje eu li que os produtores de abobrinha e pimentão estão arrancando os cabelos porque seus produtos também estão encalhados nas feiras e mercados. Pediram ajuda em dinheiro ao Comitê Europeu, que já tinha prometido uma graninha para a galera do pepino, do alface e do tomate. Acho que nunca se comeu tanta batata frita neste país!

Os alemães estão sendo taxados de incompetentes pelo resto da Europa porque não acham o foco de transmissão. O número de mortes já chegou a 26 em duas semanas, fora a quantidade de gente com sequelas da doença. A Espanha já declarou que vai atrás dos direitos dos pepinos na Justiça.

Pelo meu interesse no desfecho da história, acabei virando setorista de EHEC. Leio sobre isso o dia inteiro. De nada adiantou.

Hoje fui a um restaurante pertinho da minha casa com uma amiga que veio de Colônia me visitar. Pedido: um suco de maçã, um hamburguer e uma boa saladinha. Com alface, pepino, tomate e pimentão!

Mando notícias nos próximos dias.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Crise de identidade

Só mais uma antes de dormir (tá um barulhinho gostoso de chuva lá fora).

Perguntas que me faço quase que diariamente:

- Por que TANTA GENTE na Alemanha me chama de Marina, e não Mariana??
- Por que tem tanto maluco nas ruas de Bonn? Maluco mesmo, de falar sozinho, olhar pro céu, xingar os outros na rua do nada...
- Por que o sol não se põe às 22h durante todo o ano no mundo inteiro? É tão bom...
- Por que as pessoas aqui não vendem sorvete com o cone enrolado no guardanapo?

- Por que alemão é uma língua tão difícil? :(

Mas... Bonn?

Pois então. Eu costumava descrever Bonn apenas como "uma pequena cidade ao lado de Colônia", para que os não iniciados do mundo germânico pudessem entender melhor. A antiga capital da Alemanha Ocidental, porém, é bem mais que isso. São 320 mil habitantes de várias partes do mundo - pessoas que trabalham nos quase 150 organismos internacionais instalados aqui, como a ONU, e na estatal Deutsche Welle, com notícias em 30 línguas. Aqui também nasceu o grande compositor Beethoven, que dá nome a rua, praça, monumentos. Bonn fica às margens do Reno, um rio importante para turismo e para o comércio nesta região da Europa. A cidade, enfim, tem seu charme.
Além disso, claro, nenhuma outra cidade alemã tem o nome tão adequado para brasileiro fazer piadinha infame! ;)

Foto da Praça da Catedral, com a estátua de Beethoven ao fundo. O mercadinho rola nos fins de semana.

Parabéns, Thessa!

Não sei se todo mundo ficou sabendo por aí, mas por aqui na terra da cerveja o que bombou no fim de semana foi o aniversário de 16 anos da Thessa, uma menina que mora em Hamburgo - pelo menos até a semana passada ela morava por lá. Ela organizou a festa, pensou em cada detalhe e deve ter feito e refeito a lista de amigos para convidar. E achou que o Facebook seria a melhor forma de chamar a galera. "Pode vir quem quiser, mas me avisem antes", ressaltou na mensagem.
Pois bem, qual não foi sua surpresa, horas depois de clicar em "enviar", a pobre Thessa recebeu a confirmação de nada menos que 15.000 convidados!!! E ela ainda teve sorte, porque o convite chegou a mais de 60 mil usuários da net, segundo uma matéria que eu li. Fiquei imaginando a cara dos pais da Thessia quando ela contou: "ooops, deve vir mais gente!". Sem pestanejar, a família sumiu de casa no dia da festa (marcada para sexta-feira passada, dia 03) e chamou a polícia. Dezesseis pessoas foram presas por baderna.

Mas o melhor disso tudo foi a festa que os 1,6 mil "convidados" que apareceram fizeram na porta da casa dela. Surgiu de tudo. Churrasco, cerveja e câmeras de televisão. Na porta da casa da menina, o povo que queria entrar começou a gritar: "A gente quer ver a Thessa, vim dar parabéns a ela!!".

Os alemães podem ser espirituosos, vejam só.

http://www.youtube.com/watch?v=IEVKJsL5GM4&feature=related

domingo, 5 de junho de 2011

Alou, alou... testando

Alosson.... Na verdade, este é um teste pessoal. Nunca escrevi um blog. Talvez por ser "analógica demais", segundo definição de um amigo querido - e engraçadinho. Mas desde que troquei temporariamente (ainda não sei exatamente o quanto este "temporariamente" vai durar) o clima seco do cerrado brasileiro pelo Bratwurst às margens do rio Reno, na Alemanha, começou a me dar uma vontade louca de dividir com vocês que estão geograficamente longe, mas bem instalados no meu coração, parte das experiências que estou tendo aqui. É claro que nem tudo dá para contar. Por falta de tempo, por excesso de zelo ou por uma certa censura que os bons modos, a moral e os bons costumes impõem. Enfim, para não fugir do clichê, acredito que assim poderei estar um pouquinho mais perto de Brasília.

E se para isso será preciso ser menos preguiçosa e mais disciplinada... tá Bonn, né, fazer o quê?! :)